terça-feira, 7 de junho de 2011

Placebo

Quanto mais rápido se vão os anos, maior se torna a necessidade de uma borracha que desfaça todas as cicatrizes espalhadas pelo meu rosto.

Me diziam que o tempo é o senhor de tudo. Sobre curar feridas, sinto-me mal em discordar. Mal porque discordar, nesse caso, é o mesmo que assumir toda essa questão que fica cutucando minha cabeça por dentro. O tempo não cura nada, mesmo. Talvez cure os outros, tenha mais piedade dos outros. Talvez eu seja uma anormal que não merece a cura do tempo. Sempre soube dessa ineficácia das horas, minutos e segundos no que se refere às minhas cicatrizes, porém, acreditava que o relógio era um poderoso anestésico. Tão logo recordava isso, já começava a fugir, buscando nos ponteiros o alívio da dor, minhas pesadas doses de morfina. Funcionava muito bem, preciso afirmar. Era uma paz incrível, sensação de vazio muito bem vinda quando se carrega certos pesos por muito tempo.

Então vinha o grande problema: encarar minhas cicatrizes. Tudo muito bem, muito leve, até buscar a fonte da tristeza, da deformação. Como eu tinha definido a situação? Ah, sim, que "reencontrar foi o mesmo que trazer tudo à tona, reviver os velhos medos, naufragar no caos".

Daí me lembro de todo aquele sermão que os mais velhos dão aos mais jovens sobre o uso de drogas, lícitas ou não: anestesiar não funciona, o efeito passa tão depressa como volta a dor, ainda pior. Saiba, minha droga é lícita e muito recomendada, mas não menos enganosa. Minha droga é o tempo.


As rachaduras na minha máscara não anunciam nem um milésimo do que se passa sob ela.