segunda-feira, 25 de abril de 2011

Meus luares

Encontrei isso nos rascunhos, datado de 18/01. Duas coisas me deixam abismadas.
1ª: eu ter tido essa delicadeza;
2ª: eu não fazer ideia de pra quem isso foi escrito. Acho que foi só uma mentira conveniente de escritora, haha.

Olho o céu e vejo a lua
entrecortada por nuvens cinzentas.
Minto.
Não vejo a lua, vejo um luar disforme,
a auréola branca e crescente que amanhã já será cheia
e furtará do resto toda a atenção.
Nos seus olhos vejo o mesmo:
não os olhos, mas o brilho encoberto por segredo e mistério,
cores e partículas, uma nebulosa.
Pena não haver estudo astronômico que me permita
conhecer suas fases e prever
a noite em que crescerá para mim;
tampouco se deixará de furtar-me o resto da atenção,
me levará para dentro dessas nuvens
ou, ainda, se nos encontraremos
num eclipse.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

E como.

Acordou mal.

Pensou em mudar o cabelo, e mudou. Nada muito drástico, claro, não fazia parte dela qualquer tipo de modificação radical. Um corte aqui, uma cor ali... foi testar nas calçadas. A tão esperada aprovação - ou invisibilidade, um sonho antigo - se desfez em nada. Absolutamente nada. Todos que passavam por ela, pela segurança momentânea que cabelos novos trazem, pela satisfação do contexto em que ela se emergiu, todos continuavam com seus olhos superiores, todos a encaravam como quem analisa um estrangeiro mal acostumado aos hábitos da região. Nem rejeição pôde ser detectada, só mesquinharia mesmo.

Pensou em mudar as roupas, jogar todas as combinações antigas no lixo e se adequar a uma moda mais despojada, como diziam por aí. Ou, quem sabe, aderir a significações alternativas, fazer parte de um grupo que se reconhecesse pelos trajes, se sentindo assim acolhida, sendo o encaixe de algo. Ou, ainda, se sentir bonita e feminina, equação simplificada de todo desejo de mulher. Pesquisou por entre estilos, comprou uma ou outra peça, se imaginou como as lindas garotas que via nas fotos, nas campanhas publicitárias, as que eram assediadas por homens realmente interessantes. Entretanto, toda tentativa era frustrada. Nenhuma roupa ficava bem pro espelho, a listrada aumentava a barriga, a saia curta exibia pernas que não eram de se exibir, os decotes não se preenchiam, o batom vermelho parecia vulgar, os saltos lhe tiravam classe e acrescentavam desastre ao passo.

Pensou em amigos novos. Socializar, ser querida, mudança estética alguma compensaria o prazer de ser requisitada num grupo. Saiu, visitou novos lugares mas não teve uma palavra sequer pra trocar com quem quer que fosse. Era como se a necessidade enrolasse a língua, ensurdecesse, apagasse do cérebro todos os bons assuntos, tirasse do rosto a coragem de um apelo elementar, o olho no olho.

Pensou em cursos, viagens, aprendizado. Nem adiantava, era tudo fogo de palha, perdia a graça facilmente, era abandonado.

Pensou em se matar, maior medo e tabu da família. Não resolveria, falariam disso por um, dois meses, depois se esqueceriam e ela viraria uma memória isolada. Pior, pararia na boca da chatisse religiosa, daquela história de "Ela não tinha o direito de fazer isso, só Deus o tem, ela não pensou nos que gostavam tanto dela?", como se quem pensa em morte se preocupasse com algo além da própria dor. Ela nunca condenava os suicidas, mas lamentava o que eles se tornavam: instrumentos gerais de pena.

As idéias da noite enfim terminaram. Deitada de bruços sobre um travesseiro velho e amarelado, resolveu fechar os olhos e esquecer, fugir dos pensamentos, fugir do mundo, fugir das convenções, dormir. Fugir, fugir era a palavra mais fixa naquela mente. Tão mais fácil ignorar essas questões e fugir. "Amanhã acordarei bem."

Acordou mal.