segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Uma pena

Sob um céu muito cinzento e envolta num vento cortante, assistia a uma criança brincando na areia suja da prainha. Ela parecia totalmente absorta em seu trabalho: construir um enorme e imponente castelo - que a mim mais parecia um monte indefinível, mas quem sou eu para enxergar toda a beleza por trás da imaginação infantil? Com a dificuldade de suas mãozinhas pouco habilidosas, raspava a areia compactada e ia a acumulando a um lado; depois, largava a cavação para caçar pedrinhas - ou melhor, grandes rochedos que cercassem e protegessem devidamente sua grande obra - e logo voltava com os braços transbordando em cascalho que era amontoado noutro canto. Material acumulado, começava a construção em si. A serrinha de areia ia tomando alguma forma muito sensata para aquela mente despreocupada, algo meio achatado e arredondado. Às vezes ela esbarrava sem querer e tudo ia ao chão, não que isso a fizesse desistir. Voltava a erguer tudo e sempre que fosse necessário, paciência que invejei. Cavou mais um pouco e fez dois amontoados sobre o castelo em extremos opostos, deveriam ser torres. As pedrinhas foram espalhadas fartamente ao redor mas com delicadeza já que cada uma tinha um lugar pré-determinado, o que incluia uma ou outra troca ocasional. Fez do nada uma cara de preocupação, parecia ter se esquecido de algo. Correu ao longe e sumiu, eu não sabia se voltaria.

Eu ando esperando alguma coisa. Não que eu goste de esperar - queria a paciência da criança no castelo -, na verdade detesto e quase nunca espero por nada. Tenho o dom de me interromper abruptamente sempre que os fatos insistem em tentar se diluir no tão temido verbo aguardar. Me inquietam os que falam lentamente, os que me impõem suspense demais, as filas, os resultados. Ainda sim, eu ando esperando alguma coisa. Mesmo que nem tudo corra como desejo, ou melhor, quase nada, conto com um momento crucial nos acontecimentos, aquele 11h59min dos relógios de ponteiros que pode morrer às 12h ou simplesmente parar ali e emoldurar uma eternidade, os finais felizes: espero a chance da finalização, oportunidade essa que nunca me é dada. Meus relógios sempre giram rápido demais...

E então a criança voltou com as duas mãos preenchidas. A direita trazia três conchas e a esquerda, uma grande pena colorida. Ela pulou a cerca de pedrinhas cuidadosamente, abaixou-se e afundou as três conchas na frente do castelo: uma delas era a gigantesca porta e as outras duas eram janelinhas em cada torre. Agora só restava o grand finale, a pena que seria a bandeira do topo. Seus olhos faiscavam ao imaginar que todo aquele trabalho resultaria em composição tão bela. Lamentável foi o céu nublado ter escolhido se desfazer naquele instante, suas lágrimas desmanchando a construção, lavando tudo. A criança saiu correndo em busca de abrigo. A pena caiu de sua mão esquerda e foi esquecida na areia suja. O castelo jamais foi finalizado.

Um comentário:

  1. É, infelizmente mesmo tendo paciência e sabendo lidar com as dificuldades, e sempre fazendo algo de útil enquanto não acontece o que esperamos, pode tudo dar errado. Mas o bom de ser assim é que pode-se aprender alguma coisa com os fracassos.

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